terça-feira, 2 de dezembro de 2008

ÓCIO SEM CULPA -Luiz Lyrio



ÓCIO SEM CULPA


Ócio, sm. 1. Descanso ou folga do trabalho. 2. Lazer. 3. Preguiça, moleza.
Nem o meu pequeno dicionário poupa a palavra ócio do estigma negativo que lhe foi imposto através dos séculos. No século XXI, a palavra, aos poucos, vai assumindo definitivamente seu significado exclusivamente negativo. Numa sociedade onde o lema é trabalhar e consumir, usufruir do ócio tornou-se um terrível pecado.
Ai daquele que escolhe o ócio ao trabalho! Entendendo liberdade como o exercício do nosso direito de escolha, nas sociedades do século XXI, é proibido escolher viver uma vida ociosa e de contemplação. Se, em uma época ainda recente, sobrava-nos a opção de enveredarmos por um modo de vida ocioso marginal, porém ainda admirado por uma parcela de mentalidade mais avançada da sociedade, hoje, o ócio tornou-se a marca daquele que não pode ter direito à satisfação de suas necessidades básicas – “quem não trabalha não come” - e ao convívio social e deve ser “tratado”, receber alguma ajuda especializada. Quem pratica e quer viver no ócio está “doente”, “deprimido” ou “desgostoso da vida”, como diziam os antigos.
O pior de tudo, porém, é que já está impregnada dentro de cada um de nós a idéia de que o ócio é um “pecado”.

E é entristecido que vejo as pessoas perdendo, à medida que o tempo passa, a capacidade de ficar algum tempo descansando, sem sentir culpa. “O que você fez de produtivo hoje?”, pergunta-nos, diariamente, o sempre chato e inconveniente grilo falante que alguns chamam de consciência e todos temos dentro de nós. E o homem do século XXI, também questionado vinte e quatro horas por dia pelas terríveis máquinas criadas para condicioná-lo, doutriná-lo e controlá-lo, sofre, quando constata que, ao fim de um dia, nada fez de produtivo. Alguns, mais criativos, procuram unir o útil ao agradável, “fazendo alguma coisa” ao mesmo tempo em que se dedicam a um falso e “ocupado” ócio. Mas ninguém se sente bem “ocioso”.


Até os pobres velhos aposentados, que já dedicaram décadas de sua vida ao exercício de uma atividade produtiva, sentem-se mal em serem “improdutivos” e muitos procuram uma atividade, não porque precisam, mas para escapar da depressão proveniente do fato de estarem atormentados por um torturante sentimento de culpa.


Diante de tudo isso, só existe uma cura para essa terrível doença que acomete o homem do século XXI: combater o sentimento de culpa e exercer o ócio em toda a sua plenitude. Ser ou estar ocioso é digno, bom e saudável! Como diz um trecho da Bíblia, há um tempo para tudo. Há o tempo de trabalhar e o tempo de descansar, folgar, dedicar-se ao lazer. Há sim o tempo para praticar a preguiça, a boa preguiça que alguns religiosos corruptos, regiamente recompensados pelos patrões da época, incluíram entre os sete pecados capitais, provavelmente no lugar de outro pecado como “intolerância religiosa”, “exploração do semelhante”, “sede de poder” ou coisa parecida.

Hoje, o significado doentio e negativo da palavra “ócio” impede que o homem do século XXI se “desrobotize” e pratique, sem nenhum “grilo” a atormentá-lo, o exercício da boa e saudável preguiça. Diante disso, só me resta aconselhar a você, caro leitor, que pratique o ócio sem culpa. E, de preferência, que pratique o ócio remunerado, aquele destituído de preocupações com dividas, sobrevivência, pensões alimentícias ou coisa que o valha. E, se alguém tentar incutir-lhe culpa por estar desocupado, simplesmente nada responda. Desligue seu cérebro, feche os olhos, relaxe, vire para o outro lado e finja estar dormindo. Quem sente falta, que vá trabalhar.

Luiz Lyrio – Professor Aposentado – Aracaju – SE – www.lyr.myblog.com.br
Rua Campo do Brito, 162 – Tels (79)3213 1351 / (79)8803 4136

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